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Muitos Carnavais – Página: 2 – Sonhos de Carnavais

Tristeza por favor vá embora

Em 1966, o clube Monte Líbano promoveu o seu famoso baile Uma Noite em Bagdá sob um cenário de Paris da belle époque. Grito final do carnaval daquele ano, a festa reuniu, dizia o texto da revista Manchete, algumas das mais belas mulheres do Rio e viveu seu instante de luxo com o concurso do qual participaram as melhores fantasia daquele ano.

Os foliões elegantes davam início a peregrinação carnavalesca no baile do Copa, no sábado. Domingo a opção era o baile do Hotel Quitandinha, segunda o Municipal e fechavam na terça com o clube da Lagoa.

Naquele ano, o sucesso musical era a marchinha “tristeza” de Haroldo Lobo e Miltinho. A letra dizia assim:

Tristeza por favor vai embora
A minha alma que chora
Está vendo o meu fim

Fez do meu coração
A sua moradia
Já é demais o meu penar

Quero voltar aquela
Vida de alegria
Quero de novo cantar

Queremos todos voltar aquela vida de alegria e que a tristeza vá embora.

Elza Soares no Salgueiro

No desfile de 2019, a presença feminina nos carros de som das agremiações de samba, do Rio de Janeiro, só fez aumentar.Surge uma nova geração de pastoras, como são chamadas as vozes de apoio aos intérpretes oficiais. Tecnicamente, elas contribuem com tons mais suaves o coro predominantemente masculino.

Júlia Alan, Cecília Preto, Rosilene Alegria, Larissa Cruz reafirmaram a importância do canto feminino para a hamonia do desfile.

O protagonismo masculino do canto, entretanto, foi quebrado há muito tempo pelo Salgueiro. Em 1969, com o enredo: “Bahia de todos os deuses”,de Bala e Manuel Rosa, a brava Elza Soares, foi convidada para ser a primeira puxadora de sambas de uma escola do Rio de Janeiro. Honrando seu lema “Nem melhor, nem pior, apenas uma escolar diferente” o Salqueiro inovou mais uma vez.

Pela primeira vez, a já consagrada sambista, desfilava numa escola de samba, “puxando” o samba enredo. Entrou pela porta da frente. Estreou de forma consagradora.

O carro de som era formado por Noel Rosa de Oliveira, Carlinhos Pepé e por Elza.Elza lembra: “Em 1969, não tinha horário para os desfiles. Desfilamos ao meio-dia, debaixo de sol forte(O calor excessivo fez a cantora passar mal), e eu estava sozinha. Eu não sabia que cantaria tantas vezes, mas dei conta. Hoje é mole puxar samba na avenida!”. Foi campeã na estreia. O Salgueiro conquistou seu quarto título.

Vale o registro de que antes de “puxar” o samba do Salgueiro na avenida, Elza, em 1967, já tinha gravado “O mundo encantado de Monteiro Lobato”, samba de Mangueira . No mesmo ano, gravou : “Portela querida” e “Palmas no Portão”, samba do Bafo da Onça.

O sucesso da ousadia salgueirense fez com que a Mocidade de Padre Miguel, escola da região onde a cantora passou a infância, a convidasse para defender os sambas enredos de 1973 (Rio zé Pereira), 1974 (A Festa do Divino), 1975( O mundo fantástico do Uirapuru) e 1976(Mãe Menininha do Gantois). A cantora, que por ter nascido em Padre Miguel, sempre foi Mocidade, assumiu de forma definitiva seu amor pela verde e branco.Amor ,inequivocamente, consagrado com a gravação de “Salve a Mocidade”, de Luís Reis, em 1974.

Ela ainda “puxou” quatro defiles. Em 1979, defendeu duas escolas: Acadêmicos do Cubango, com “Afoxé”; e Estácio de Sá, com “Das trevas ao sol, uma odisseia dos Karajas”. Em 1985, fez uma parceria com Quinho, na União da Ilha, com, “Um Herói, uma Canção, um Enredo”; e em 2000, de novo Acadêmicos do Cubango, por uma “Independência de fato”

Além da participação nos defiles, Elza gravou inúmeros sambas de enredo em discos.
Em 2020, Elza será enredo da escola da Vila Vintém. Ao longo de sua rica trajetória a cantora, uma sambista-jazzista, sempre se reinventado para sobreviver. brilhará mais uma vez no cortejo carnavalesco.

Provavelmente, as muitas “Elzas” estarão representadas na Sapucaí. Dentre elas, a intérprete pioneira de sambas de enredos, abrindo espaço num mundo, ainda hoje, predominantemente masculino.

Tijuca 2019: Lobo na pele de cordeiro

Quarenta dias antes da Páscoa, acontece o carnaval. Uma comemoração pagã, que de certa forma remete-se ao calendário religioso. Após a festa da carne têm início a Quaresma.

Por outro lado, na origem do samba e das escolas de samba, encontramos o candomblé.

A religião sempre esteve relacionada aos festejos momescos. É indissociável.

Entretanto, nem sempre temas, explicitamente, religiosos funcionam. Nos desfiles das escolas de samba o tema sacro pode reavivar a origem processional da liturgia do desfile e tranformar o cortejo pagão algo muito próximo de um cortejo religioso.

Se o carnavalesco errar na mão, essa interface delicada entre o profano e o sagrado pode, sutilmete, reavivar o caráter ceremonial da apresentação.

Talvez tenha sido esta, a razão da escola ter ficado apenas com a sétima colocação, em 2019. Um tema de fácil compreensão: “Cada macaco no seu galho. Ó, meu Pai, me dê o pão que eu não morro de fome!”,ganhou uma forte marca bíblica.Nao deu liga.

Fazia parte do enredo “traçar uma relação metafórica do pão com a fome e a religiosidade, pois ele alimenta o corpo e a alma“.

As encenações à frente de cada alegoria, criadas pelo ator e diretor Jan Oliveira, provocaram impacto e controvérsia. “Cristo carregando a cruz” e sendo açoitado, que estava na frente da alegoria “Multiplica o sagrado pão”, onde nas laterais senhoras vestidas de Nossa Senhora cantavam o samba em tom de clamor em direção do público. Para alguns, o recurso foi utilizado de forma excessiva.

O samba, feito em feitio de oração, abusou no tom de súplica. Um dos jugadores considerou equivocado esse caminho. Considerou que a composição: “em alguns momentos funciona bem; em outros, parece criar um conflito com o perfil pagão do carnaval e atmosfera de louvor imposta pela letra“.

Os julgadores apontaram, também, um certo clima de “austeridade” no canto, pois o samba “foi todo composto em tom menor, com escalas descendentes”.

Para finalizar, a Tijuca também teve uma uma preocupacão em abordar o tema dentro de uma perspectiva política. Abordagem quase obrigatória nos desfiles das escolas do Rio de Janeiro, nos últimos anos. O samba enredo, em descompasso, passou alheio à esse engajamento.

Jesus voltará a Sapucaí em 2020, vamos ver se vai dar samba.

Chegou general da banda , he he

Em 1983, o Brasil perdeu seu único “General da Banda”, Blecaute. Não surgiu, desde então, na nossa música, alguém que merecesse tão alta patente.

Vestido com uma farda verde engalanada,dragonas, alamares dourados e uma profusão de medalhas de latão, o cantor Blecaute abria a folia carioca, nos anos 50 e parte dos 60, ao som do samba “General da Banda”, de Tancredo Silva, Sátyro de Mello e José Alcides, seu primeiro grande sucesso, gravado em 1949.

Talvez inspirado no grande cantor, o governador do estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, resolveu instituir a função de general para a Polícia Militar e para o Corpo de Bombeiros. Uma jaboticaba carioca.

Quem sabe quis fazer média com a cúpula das citadas instituições. Não se pode ter certeza. É algo tão inútil, que causa espanto imaginar, que a maior autoriadade local, encontra tempo para esses atos de ostentação. Lembram da “faixa governamental” criada para incrementar a cerimônia de posse?

Enquanto coronéis fingem uma patente inexistente, os números da violência não param de crescer. Assaltantes, meliantes e golpistas, inspiram terror à população carioca.

E o pior, não sei se pega, se a inusitada graduação vai inspirar o respeito desejado.

Blecaute, sim, quando chegava, ninguém tinha dúvida: chegou o “General da Banda”.

Na foto publicada, o cantor Blacaute estava animando a “Noite em Beirute”, festa pré-carnavalesca realizada na boate “Fred`s”, em Copacabana, no longínquo ano de 1959.

Rainha do povo

No desfile de 2019, Viviane Araújo, rainha da bateria da Acadêmicos do Salgueiro, veio fantasiada de borboleta. Na verdade, Oyá. Diz a lenda:

“Exú fez um encantamento para Oyá. Toda vez que sentisse medo, ela se transformaria em borboleta. Que é linda colorida e inofensiva. Oyá, voltando à sua forma de Orixá, perguntou a Exú o porquê de se tornar uma borboleta, e não outro elemento da natureza.

Exú lhe respondeu: Como o vento, caso ficasse nervosa, você arrasaria o mundo em vendaval. Como raio, você acabaria com as aldeias. Como o fogo, você destruiria todo o planeta. Como borboleta, além de manter a suas cores e perfumes que simbolizam a sorte, você também será capaz de voar e afinal de contas, quem em seu juízo perfeito mataria uma bela borboleta?”

E afinal de contas, quem em seu juízo perfeito é capaz de discordar que a rainha das rainhas das escolas de samba do Rio de Janeiro é Viviane Araújo?

Começou sua trajetória em 1994, quando venceu o concurso das panteras, no Clube Monte Líbano.
No carnaval seguinte, em 1995, desfilou pela Império da Tijuca e Beija-Flor. Brilhou, posteriormente, na Mocidade. Mas desde de 2008, entregou seu coração a vermelho e branco tijucana.

Doze carnavais à frente dos ritimistas do Salgueiro é, inequivocamente, a rainha do povo.

Representa com suas curvas, o corpo da mulher brasileira. É um corpo à moda antiga, não aparenta ter interferências de dietas draconianas e jejuns intermitentes. Viviane come, ri, vive como quem a aplaude. É uma majestade exercida pela identificação, não pela alteridade.

Não é mais jovem, e ninguém se importa. Aqueles que querem substituí-la por uma passista mais nova ficam atônitos, aos quarenta e três anos, não há quem torça pela sua aposentadoria.

A coreografia dos seus passos , sempre delicados, reforçam o seu poder. Um empoderamento suave. De vez em quando, com seu tamborim, mistura-se aos ritimistas, e como nenhuma outra, integra-se à sua “furiosa” bateria. A arquirbancada delira. Puro carisma.

Vestida de borboleta, a rainha do povo, brihou no Salgueiro em 2019.

Witzel cai no samba no seu primeiro ano de mandato

Na foto dessa postagem vemos a família do governador do estado do Rio de Janeiro, na passarela do samba, em 2019. Primeiro ano do mandato de Wilson Witzel.

Adequadamente fantasiados, o mandatário carioca ostentava o adereço predileto dos poderosos, o indefectível chapéu Panamá. Irradiava felicidade Sua esposa, Helena Witzel, exibia um fascinator de plumas verdes.Talvez, uma citação a sua escola de coração:Imperatriz Leopoldinense. Já sabemos que a primeira-dama tem paixão pelo carnaval. Paixão, que com certeza, contribuiu para que o governador prestigiasse os desfiles, do grupo especial, carioca.

O casal levou os filhos, Beatriz ,Bárbara e o irmão que estava com uma fantasia bastante divertida: Wally.

Wally sempre com uma camisa listrada em vermelho e branco, e com um gorro nas mesmas cores, é personagem central de série de livros, onde o leitor é convidado a encontrar o personagem perdido em uma página repleta de ilustrações, o Wally de Witzel estava no sambódromo, e era o seu filho Vicenzo..

O único da prole que não deu as caras na passarela do samba foi Erick Witzel, primogênito, filho do primeiro casamento do governador.

O ex-juiz, criado em Vila Isabel, tem demostrando real apreço pelo certame carnavalesco. Salgueirense, durante o desfile da vermelho e branco,recebeu do presidente da escolar tijucana, André Vaz, uma réplica da faixa de governador .

A tal faixa, que Wilson Witzel mandou fazer no Rio de Janeiro (não era praxe), para incrementar sua cerimônia de posse, e que para alguns,representou um gesto de puro deslumbramento, virou um dos hits desse carnaval. Até seus filhos não abriram mão do acessório.

Ao longo da noite, Witzel não negou fogo, foi para a pista sambar com todas as escolas. Exceto a Paraíso da Tuiuti, que levou a crítica política ao Sambódromo. Quando a Mangueira passou, com um enredo também muito politizado, ele só desceu do camarote porque a diretoria pediu.

Enquanto Witzel recebia os mangueirenses na avenida, em seu camarote, estavam os deputados estadual Rodrigo Amorim, o mais votado nas últimas eleições, e o deputado federal Daniel Silveira, ambos do PSL.

Nos dois últimos anos, enredos, claremente, de esquerda pontificaram. Deve ter sido confuso para o governador que estava no palanque, quando os citados deputados quebraram a placa com o nome da vereadora Mariele , assisitir acompanhado dos mesmos as homenagens à vereadora, prestadas por mais de uma escola de samba. Mangueira e Vila passaram com faixas, comissao de frente e familiares da vereadora assassinada.

Foi decisão de Witzel reativar o camarote do estado na Passarela do Samba, utilizado pela últma vez em 2015. Aliás, naquele ano, Helena e o marido foram convidados a ver as escolas, tendo como anfitrião Pezão. Não era a primeira vez dos dois no camarote. Em 2014, na gestão de Sérgio Cabral, eles também passaram por lá.

Este ano, o concorrido camarote recebeu, também, o juiz da Lava Jato, Marcelo Bretas, e o governador de São Paulo, João Dória.

Dória e Witzel assistiram juntos ao desfile do Império Serrano, a escola que abriu a disputa.
Puxado por Witzel, os dois ensaiaram passos de samba juntos. Apesar da empolgação, Witzel não parecia muito familiarizado com o samba que era um clássico de Gonzaguinha: ele só cantava o refrão.

Nos últimos anos a maior festa carioca vem sofrendo um inequívoca hostilidade do governo municipal. O último ataque do prefeito foi impeder que a prefeitura preste serviços de limpeza e segurança do Sambódromo durante o carnaval.

Diante disso, chega ser um alento, ver o governador do estado envovido com a nossa maior festa popular. Parece pouco, mas na atual conjuntura, não é.

No seu primeiro carnaval como governador do estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel não negou fogo, mirou na cabecinha e acertou no alvo, prestigiou a maior festa da cidade. Ponto para o governador.

Gaultier na Portela

Tarsila eternizou uma torre Eiffel, alegorizada num coreto, em 1924, no bairro da zona norte carioca.

Pronto! Madureira, torre Eiffel, França e Gaultier. Isso mesmo, em 2019, o vanguardista estilista francês, Jean Paul Gaultier, desenhou fantasias para a escola de samba de Madureira.

O jovem que impressionou Pierre Cardin com seus desenhos. Causou furor com seus figurinos para os shows da cantora Madonna, na década de 1990. Dentre eles o sutiã cônico.

A expectativa é que o figurinista francês viesse no carro alegórico, não veio. Alegando forte gripe, não fez falta. Seus convidados, modelos brasileiros que são sucesso no circuito internacional da moda o substituíram com igual glamour.

No carro alegórico que reproduzia o quadro da pintora Tarsila do Amaral, “Carnaval em Madureira”, Carol Trentini, Laís Ribeiro, Jhona Burjack e a blogueira Camila Coutinho brilharam com os modelos desenhados pelo francês.

A modelo gaúcha, vestiu um body nude com plumas e um clássico de Gaultier, o sutiã cônico.

A piauiense Laís Ribeiro, veio com um costão, em plumas, azul e branco. Angel da Victoria`s Secret é considerada uma das modelos mais sexys do mundo.

Vestido de marinheiro, Jhona Burjack, um dos modelos brasileiros de maior sucesso no exterior, completou a constelação de beldades.

A presença de Jhona confirma o milagre do carnaval. O belo modelo, até os seus 17 anos vendia peixe na periferia de Brasília.

Nascido em Gama, no Distrito Federal, Jhona teve uma infância humilde. Filho de caixa de mercado e de um pedreiro, começou a trabalhar aos 12 anos como garçom no bar de um tio, e depois em uma peixaria.

O peixeiro virou celebridade, e finalmente, marinheiro no desfile da escola de samba carioca.

A França em Madureira, Gaultier na Portela, tudo junto e misturado. Evoé Portela.

OBS. Com o enredo, “Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir cantar um sabiá”, a escola homenageou a cantora Clara Nunes. A agremiação ficou em quarto lugar.

O feitiço da polarização

O pendão estava lá, mais esperançoso do que nunca. Não era verde e amarelo como de costume, mas verde rosa. Possuía um dístico inusitado: índios, negros e pobres, para não deixar dúvida de quem queria representar. A releitura da bandeira brasileira, feita pela “Estação Primeira”, foi um dos pontos altos do seu desfile.

Definido o resultado, no sábado das campeãs, a terceira colocada, Vila Isabel desfraldou o auriverde símbolo máximo da pátria. Uma clara resposta à escola vencedora.

Se o desfile da “Escola de Noel” enalteceu a princesa que dá nome a agremiação, a “Escola de Cartola” fez questão de criticar: o sangue dos escravizados manchava a imagem da redentora. Se políticos e artistas de esquerda carregavam a releitura do pavilhão pátrio realizada pela verde e rosa, o lábaro oficial, desfraldado no último dia de desfile pela azul e branco, representava um alinhamento mais conservador.

Assim temos passados os dias: ou uma coisa ou outra, sim ou não, verde-amarelo ou vermelho, esquerda ou fascismo. É o chamado pensamento binário.

Alimentamos a repulsa a quem pensa diferente. Participamos de grupos no whatsApp , onde todos pensam da mesma foram. Nos protegemos em bolhas. Você é obrigado a escolher entre duas opções.Deletamos o contraditório.

O meio do caminho se perdeu, e com ele sumiu também o bom senso, o equilíbrio, a ponderação, dentre muitas outras qualidades.

A densa fumaça do feitiço da polarização não nos permite enxergar nuances. Os adeptos, sempre fervorosos, do governo anterior, ou do governo atual, se recusam a admitir falhas dos seus “guias” políticos. Um tem a certeza que o outro é um idiota.

Mesmo que você não tenha escolhido um dos dois lados, não pense que escapará. O democrático direito de se recusar a escolher está vetado. Mesmo que você explique que não conseguiu votar útil, que repudiava as duas alternativas, você será renegado.

As eleições passaram, mas o clima de ódio continuou. O carnaval de 2019 foi prova disso.

A rainha do baile do COPA, de 2019, Deborah Seco

Na abertura do carnaval carioca de 2019, a atriz Deborah Secco brilhou. Foi ela a escolhida para ser a rainha do baile do Copacabana Palace.

O tema da festa, este ano, foi Itália. Deborah, não sei se por ter ascendência italiana, foi coroada no baile mais chique da cidade.

Para o “Dolce Carnavale”, a atriz escolheu encarnar, nada menos do que Sophia Loren. A ousadia não teve limites. A italiana, hoje com 84 anos, é um paradigma da beleza voluptuosa das habitantes da península.

Talvez, as curvas generosas da morena que encantou o mundo em meados do século passado não tenham encontrado repercussão no corpo sarado da brasileira. Mas, com relação a produção, o esforço foi visível: uma peruca cacheada feita com cabelos naturais, lentes de contato escuras e um maiô preto cavado com fio-dental e tiras de vinil. O estilista Henry Filho, buscou inspiração no filme “Marriage Italian Style” (1964).

Ao chegar usou ainda um tule plissado negro com 150 metros e combinou o look poderoso com joias de 20 quilates, com valor aproximado de R$ 1,5 milhão.

No disputado baile da Arara, na terça-feira, Deborah arrasou de novo. Usou um macacão de tule transparente, bordado de cristais. Look de Michelly X em criação do stylist Luis Fiod e com sapatos de Fernando Pires

Quando o esdrúxulo causa uma surpresa

Há bônus e ônus em ser uma figura pública. Ao se candidatar a um cargo eletivo, além dos conhecimentos necessários para o exercício da função, o candidato tem que avaliar como anda o seu estado emocional.

Deve ser difícil acordar de manhã, abrir o jornal e se ver alvo de críticas, as vezes injustas. Ossos do ofício.

Desde sempre, o carnaval foi uma das manifestações prediletas da população para extravasar suas discordâncias com relação aos governantes. Máscaras e bonecos representando autoridades desfilam em blocos de todo país. Nenhum governante perdeu o cargo em função dos deboches momescos.

Infelizmente, o nosso presidente perdeu a cabeça com as fantasias de laranjas que marcaram presença nos cordões carnavalescos.

Laranjas? Sim, laranjas. Não, propriamente, referindo-se ao seu significado frutífero. Mas “o laranja” que assume uma compra, a propriedade de um imóvel, de um bem, para esconder o enriquecimento ilícito de um político. Não sei o quê as laranjas tem a ver, mas laranja também é isso.

A fantasia vitoriosa no concurso “Serpentina de Ouro ” promovido pelo jornal O Globo foi a de “caixa eletrônico e 48 envelopes de depósitos”, em referência às movimentações financeiras atípicas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro.

O idealizador foi o professor Faber Paganoto, a partir de um meme no Twitter que dizia “somos todos depósitos do Bolsonaro “. Faber, que saiu vestido de caixa eletrônico, juntou 48 amigos, que se fantasiaram de envelopes para depósitos de R$ 2 mil, cada um. A cor escolhida para os cheques e para o caixa eletrônico era foi ….laranja.

Gostei também do “laranjal do Bozo”, essa clicada pelo fotografo Rafael Medeiros, no bloco Galo da Madrugada, em Recife.

Quem não gostou nada das alusões às candidaturas mobilizadas pelo PSL e a Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonoro suspeito de atuar como laranja, foi o presidente.

Para incendiar mais ainda, assessores ainda relataram a ocorrência de manifestações e xingamentos contra o capitão. Esse ano, os bonecos do presidente e da primeira-dama Michelle, receberam vaias e foram alvos de latinhas de cerveja. Não suportou as vaias recebidas em várias capitais do país.

O mesmo Bolsonaro que não viu nada demais, em 2016, ao virar um dos bonecos gigantes nas ruas de Olinda. Postando, inclusive noticias sobre o fato, ficou bastante aborrecido com essa chicana toda e resolveu se vingar.

Em mais uma atitude marcada pela excentricidade, a vendeta veio na forma de postagem de um filme, com conteúdo de sexo explicito no seu Twitter, com 3,4 milhões de seguidores.

No filme os artistas, Paulx Castello e Sofia Lacre, realizaram uma performance, para muitos escatológica, num pequeno bloco paulista. Encenaram para um publico minúsculo, talvez sessenta pessoas, um manifesto pelo liberdade sexual. Um das pessoas dança, introduz os dedos no ânus e, em certo momento, abaixa a cabeça para que um outro homem urine sobre ele.

O ato tinha como objetivo “exibir algo do que se tem produzido em relação as sexualidades não normativas “.

Um manifesto publicado pelos performers, após a instauração da polêmica. Dizia: “Nossos corpos e desejos dissidentes rompem com os papéis de género machistas e misóginos que enxergam os corpos feminizados como buracos. Nós estamos do lado da imoralidade de vidas ditas como irrelevantes e matáveis. Somos corpos não docilizados da escatologia social “.

Um ato assistido por um número restrito de pessoas, no pequeno bloco, ganhou o mundo. Ao que tudo indica o objetivo era passar uma ideia que o carnaval era uma festa dissoluta, imoral. Ao concluir o tuíte, Bolsonaro sugeria uma reflexão: “Não me sinto confortável em mostrar, mas temos que expor a verdade para a população ter conhecimento e sempre tomar as suas prioridades. Isto é que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro”.

Não é verdade. De forma alguma esse é o clima dominante no carnaval de rua brasileiro.

A excêntrica postagem nada mais fez do que divulgar aquilo que dizia repudiar. O próprio Bolsonaro chama atenção para uma das práticas encenadas: o “golden shower “, prática que diz desconhecer. não conseguiu convencer a ninguém com seu esdrúxulo ato de represália.

O desnecessário tuíte foi a patética contribuição do presidente Bolsonaro ao seu primeiro carnaval. Um tiro no pé.