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O Carnaval – Página: 7 – Sonhos de Carnavais

Índio não quer apito e nem carne de papelão

O mesmo agronegócio que deixou em meia-guarda a Imperatriz Leopoldinense, devido às críticas ao setor enunciadas no enredo da Escola em 2017: “Xingu – O clamor que vem da Floresta”, está nas cordas com a denúncia da Operação Carne fraca, empreendida pela Polícia Federal.

O belo monstro roubas as terras dos seus filhos, devora as matas e seca os rios. Tanta riqueza que a cobiça destruiu. Sou o filho esquecido do mundo, minha cor é vermelho de dor, o meu canto é bravo e forte, mas, é hino de paz e amor”, dizia o belo samba da agremiação. Com certeza esse foi o tema mais politizado a desfilar na passarela do samba em 2017.

A luta dos povos indígenas contra a perda de terras, o desmatamento, o uso indevido de agrotóxicos, as queimadas, os madeireiros, e os danos ambientais causados pela Usina Hidroelétrica de Belo Monte desencadeou a ira do agronegócio.

O senador Ronaldo Caiado (DEM) chegou a afirmar que iria propor uma comissão temática em Brasília para debater o assunto! A ideia seria convidar integrantes da Imperatriz a se explicarem, além de investigar as fontes de financiamento do grupo carnavalesco.

Uma reação em cadeia de associações e confederações intimidaram os dirigentes do grupo carnavalesco, chamando-os de ignorantes e propagadores de mensagens equivocadas com relação à atividade econômica em questão e ressaltaram a importância do segmento que representa um quarto do PIB nacional.

Ignorante, na verdade, era todo o povo brasileiro que nada sabia do envolvimento de políticos na nomeação de ficais sanitários, 70% das 27 superintendências do ministério da agricultura nos estados eram preenchidos por indicações políticas. Das 26 agencias de fiscalização 19 são controladas por partidos políticos.

Nada sabíamos sobre os pagamentos de propina a fiscais agropecuários para liberação de irregularidades na venda de produtos, alguns recebiam até peças de carnes nobres como suborno.

Ignorávamos que um terço da carne brasileira não tem qualquer fiscalização, que os frigoríficos escolhiam os fiscais que os inspecionavam, que as salsichas de peru destinadas à merenda dos alunos de escolas públicas do Paraná, na verdade eram feitas de carcaça de frango.

Desconhecíamos sobre as doses elevadas de substâncias cancerígenas, como o ácido sórbico utilizadas para maquiar carnes podres, entre outros absurdos.

A denúncia foi exagerada? Não era uma prática disseminada? Foram casos pontuais? O trabalho policial se limitou a 44 frigoríficos e resultou na investigação de 21, na cassação da licença de quatro e na interdição de três. Muito pouco num universo de 4837 frigoríficos, sim. Entretanto, a denúncia principal da Polícia Federal é de corrupção e é a comprovação inequívoca de que essa praga se espalhou pelo país. Políticos estavam onde não deviam estar.

Logo a artilharia pesada saiu em defesa dos grandes grupos econômicos. Como ousar questionar um setor tão produtivo da nossa economia? A estratégia é desqualificar e desmoralizar o fiscal que teve a coragem de denunciar. Os investigadores foram crucificados. Quem sabe até passar a ideia de que todas as operações em curso pela Policia Federal são equivocadas? Que é preciso aprovar com urgência o projeto de lei 280, do senador Renan Calheiros, que prevê uma ação penal pública por crimes de abuso de autoridade contra agentes da Administração Pública?

Na Sapucaí caciques e índios de diversas etnias desfilaram com altivez e dignidade insuspeita o drama dos seus povos. A Rainha de Ramos conquistou o sétimo lugar na classificação final , mas com certeza ficou em primeiro pela bravura: “Jamais se curvar…Salve o verde do Xingu… a esperança”.

Jesus e Oxalá juntos, não pode! O tripé da discórdia

Uma das imagens mais bonitas do desfile de 2017, o tripé Santo e Orixá, gerou desconforto na arquidiocese. A Estação Primeira de Mangueira, cujo o enredo deste ano era “Só com a ajuda do santo”, concordou em não apresentar, no desfile das campeãs, o polêmico tripé .

O carro abordava o sincretismo religioso, com o Senhor do Bonfim venerado sob a imagem do Nosso Senhor Jesus Cristo em ascensão e Oxalá , orixá associado a criação do mundo. O elemento cenográfico desfilou ao lado da ala “A lavagem do Bonfim”, premiada com o estandarte de ouro de melhor ala de 2017.

No mesmo cortejo, santos apresentavam a escola na comissão de frente, ex-votos cobriam alegorias, São Jorge apareceu numa encenação da batalha contra o dragão, uma porta bandeira representou Nossa Senhora de Aparecida , estandartes em louvor aos santos juninos, tudo sem provocar polêmica alguma.

Teria sido o fato da alegoria retratar o filho de Deus, junto a passistas seminuas o que provocou a interdição? É bom lembrar que no ano de 2016, quando a escola foi campeã, um dos carros era o “Altar de devoção católica”, com uma escultura do Menino Jesus, que não sofreu críticas.

É inequívoco que o carnaval é uma festa profana, e esse é um imbatível argumento para que qualquer religião vete o uso de seus símbolos litúrgicos, sagrados, em seus cortejos.

Curioso, entretanto, como a sociedade aceita nos espaços públicos e laicos de poder (assembleias, tribunais, câmaras, fóruns, escolas) crucifixos em suas paredes. Como deve se sentir um judeu, muçulmano, budistas ou ateu diante de uma invasão do religioso em um espaço secular?

A permeabilidade da sociedade brasileira permite. O sincretismo que deu origem à Umbanda, culto genuinamente nacional, uma jabuticaba brasileira, apoia.

Não faz sentido aceitar que baianas do candomblé lavem as escadarias do Senhor do Bomfim, em Salvador, e uma escola de samba no Rio de Janeiro não possa ter a liberdade de desfilar seu resiliente tripé.

A Arquidiocese, que já havia visitado previamente o barracão da escola, disse não ter visto a escultura. Afirmou, também , não ter feito qualquer proibição. O presidente da Mangueira encerra o assunto assegurando que “houve um entendimento com a Igreja”.

O catolicismo brasileiro sobreviveu majoritário por séculos respeitando a originalidade das suas práticas no Brasil. Será que mudou o Brasil? Ou mudou a Igreja?

Catuaba Selvagem foi a bebida oficial do carnaval de 2017

Da mesma forma que associou-se a ideia de ir ao cinema ao consumo de pipoca e refrigerante, presume-se que pular carnaval implica em beber muita cerveja .

A batalha perdida dos banheiros químicos é uma inevitável consequência desse hábito estimulado e adquirido pelos cordões cariocas.

Por décadas acompanhamos a guerra de poderosos grupos cervejeiros nacionais e internacionais pela hegemonia no carnaval carioca. Em 2017 assistimos a uma movimentação interessante dessas indústrias. Cervejarias, que por mais de uma década, patrocinaram o desfile na Sapucaí, perceberam que seu público alvo pula nos blocos da cidades. As empresas desistiram dos seus luxuosos camarotes frequentado por internacionais celebridades e passaram a investir nos blocos.

Com exceção da Itaipava, que para fazer frente a rival Antártica, pela primeira vez se tornou patrocinadora dos desfiles do sambódromo. Líder em consumo no Rio , a Antártica aumentou o patrocínio aos blocos de rua.

A guerra foi para as ruas, entretanto, surpreendente rival com atributos imbatíveis tomou a dianteira na preferência dos foliões, a Catuaba Selvagem.

Com teor alcoólico de 16%, cerca de quatro vezes mais que as cervas vendidas pelos ambulantes, é resultado de uma mistura que leva vinho tinto, extrato de guaraná e marapuana e, naturalmente, catuaba . Um poderoso entorpecente que possibilita ao folião, sair da realidade em curtíssimo espaço de tempo.
É bebida no gargalo, não precisa estar gelada e além de tudo é barata. Num momento de crise, como o que estamos vivendo, o baixo preço torna a Selvagem imbatível.

Há, entretanto, um atrativo que se sobrepõe a todos os já citados: a Catuaba tem na sua composição uma erva com comprovados efeitos afrodisíacos.

Uma pesquisa realizada em coelhos, pela Unicamp, comprovou que a erva pode ser usada para aumentar a libido em homens e mulheres. Os resultados apontam que a bebida: leva o fluxo sanguíneo até os órgãos genitais, fortifica a ereção, aumenta a excitação e prolonga orgasmos. Uma espécie de viagra entorpecedor.

Como nas bacanais da Roma antiga, as ruas do Rio de Janeiro foram tomadas pelo delírio, a turba dionisíaca embebedou-se da erva tropical em busca de subtrair-se do opressivo cotidiano. A necessidade atávica de se viver momentos de catarse a fim de se amenizar realidade opressora elegeu essa estranha mistura afrodisíaca de vinho com ervas indígenas como a bebida número um do carnaval de 2017.

O pastor que virou prefeito na cidade do pecado

Belém tem o Círio de Nazaré, Salvador a festa de Iemanjá , Juazeiro do norte a festa de padre Cícero e quem se candidatar a alcaide dessas municipalidades deve se preparar para ocupar a função de anfitrião dos eventos citados. Não importando a religiosidade do ocupante do cargo.

Causou surpresa, poucos meses, depois de eleito a recusa do prefeito em comandar a maior festa popular da cidade do Rio de Janeiro, o Carnaval. Seria pelo fato do prefeito ser um “homem de fé”? Por que motivo um prefeito pentecostal não pode comparecer ao desfile das escolas de samba no Sambódromo?

Simples, respondeu o edil : “Nós temos que respeitar as pessoas, ninguém deve ser obrigado a fazer nada”.

Inacreditável a resposta, pois é protocolar a uma função executiva comparecer a cerimônias e eventos, mesmo não gostando. Faz parte da liturgia do cargo.

Na campanha que elegeu Marcelo Crivella chefe do poder executivo municipal da cidade do Rio de Janeiro , o compromisso de se separar a profissão de fé do então candidato da sua almejada função foi reafirmado em inúmeras ocasiões. O Estado é laico.

Os quatro dias de folia atraem um milhão de pessoas para a cidade. Os hotéis, restaurantes e o comércio agradecem. O adolescente e inacreditável argumento “de que ninguém deve ser obrigado a fazer nada ” não é admissível.

Somos Kardecistas, católicos, evangélicos, pentecostais ,budistas, cristãos ortodoxos, muçulmanos , umbandistas, candomblecistas… Somos tudo isso e o prefeito é somente prefeito.

Não é demagogia ir receber as chaves do carnaval carioca, como também afirmou o gestor, é cumprir o que foi prometido na campanha. Separar o público do privado, o joio do trigo.

“O carnaval foi uma invenção do diabo que deus abençoou!” O prefeito não precisa se esconder. Não há pecado algum em comandar os festejos do momo carioca. Pecado é prometer uma coisa e fazer outra , pecado é mentir.

Foi um rio que passou na minha vida e meu coração se deixou levar

Quem nunca sentiu o corpo arrepiar ao ver esse rio passar? Agora, o arrepio é geral. As águas do ribeirão portelense inundaram a avenida. A maior vencedora do carnaval carioca, com vinte e um títulos, chegou ao pódio sem deixar dúvidas da sua merecida vitória. Há quarenta e seis anos que a azul e branco de Oswaldo Cruz não vencia sozinha.

Com certeza, a presença de Paulo Barros foi decisiva para o sucesso da agremiação. O mais premiado carnavalesco da segunda década do século vinte e um sobreviveu à desconfiança inicial de que não conseguiria executar um trabalho numa instituição com a tradição da Portela. Entretanto, nos seus dois enredos até agora desenvolvidos não só respeitou, como exaltou o patrimônio da águia carioca.

O Hino portelense também merece destaque. Samir Trindade, Elson Ramires, Neizinho do Cavaco, Paulo Lopita 77, Beto Rocha, Girão e J.Sales desenvolveram, a partir do enredo, uma composição cheia de poesia e belas harmonias. Num ano em que os sambas passaram em ritmo acelerado, abrindo mão do sincopado que lhe dá identidade, “Navega a barqueada, aos pés da santa em louvação / Para mostrar que na Portela o samba é religião. ”

Com o samba-enredo abraçado pelo povo da altaneira e cantado a plenos pulmões, a escola totalizou o máximo de pontos nos quesitos harmonia e evolução. Também ganharam nota máxima o casal de mestre e sala e porta bandeira: Danielle Nascimento e Alex Marcelino.

Muito sentida pela comunidade, a morte violenta do seu presidente, Marcos Falcon, em setembro de 2016, transformou a águia em fênix que das cinzas alçou o voo para vitória.

Ficará pra sempre na memória a ala dos crocodilos da Jamaica e os peixes nadando contra a correte na piracema da comissão de frente.

As coirmãs não fizeram feio. O voo de Aladim da Mocidade no seu tapete pra lá de mágico incendiou a Sapucaí. As baianas com as saias constituídas por saquinhos de Cosme e Damião e o deslumbrante tripé do sincrético Cristo/Oxalá provaram a força da verde e rosa. O Perseu salgueirense abriu, esplendorosamente, alas para a Divina comédia do carnaval carioca. A presença do cacique Raoni e outras lideranças indígenas na contundente crítica ao agronegócio apresentada pela Imperatriz Leopoldinense.E, por fim, a União da Ilha com seu desfile tribal divulgando a cosmogonia Banto, foi arrepiante.

Outro destaque da Portela foi uma contundente alegoria denunciando a morte do Rio Doce, em Minas Gerais, que reafirmando o papel de crítica social e politica que o desfile das escolas de samba pode apresentar. Infelizmente carros de outras agremiações perderam a direção ou se desmancharam aos olhos de todos . Acidentes trágicos que resultaram em vítimas, algumas com gravidade. Como diz o samba : … “Cantam pastoras e lavadeiras pra esquecer a dor/Tristeza foi embora, a correnteza levou“….e que leve para os tribunais os responsáveis por esses tristes episódios .

Que a vitória e a garra da comunidade de Madureira e Oswaldo Cruz inspire a todos a não esmorecer e a acreditar que ao mergulhar nas águas de um rio, esse nos levará sempre a novas experiências e quem sabe a realização dos nossos objetivos. Após uma longa espera a Portela chegou lá , campeã de 2017.

Quando a mulata é a tal!

O termo mulata, tantas vezes presente nas canções que animam há décadas o carnaval carioca, em 2017 foi alvo de grande polêmica. Isso se deu após alguns blocos no Rio de Janeiro decidiram não tocar as as marchinhas que mencionassem o vocábulo em suas letras.

De acordo com o entendimento dos seus organizadores, clássicos da folia como: O teu cabelo não nega, Mulata bossa nova e até Tropicália trazem uma mensagem que remete ao preconceito e discriminação. Um dos grupos, inclusive, promete fazer uma performance valorizando a mulher negra em seu desfile.

A raiz do problema estaria na etimologia, pois o vocábulo em questão seria uma derivação da palavra “mula”, um animal estéril, resultado do cruzamento do jumento com o cavalo. Registros indicam que durante o período escravagista brasileiro, essa palavra começou a ser usada para se referir, também, aos filhos de negros com brancos.

Há controvérsias! para alguns estudiosos ,“A palavra mulata poderia ter se originado do termo árabe muwallad (= mestiço de árabe com ‘não árabe’) ”. Como se pode observar, o termo em árabe também remete a ideia de miscigenação, assim como no idioma espanhol, onde mulata significa mestiço, pardo ou moreno.

Similar ao caso brasileiro, nos Estados Unidos, existe um termo do vocabulário racial considerado extremamente preconceituoso , a palavra nigger que foi usada pelos brancos, no período colonial, para se referir aos negros, indicando que eles eram inferiores, sub-humanos. O movimento negro norte- americano baniu o seu uso.

Assim como nigger, a palavra mulata deveria ter seu uso definitivamente banido no Brasil. Entretanto, como nem tudo que serve aos Estados Unidos se aplica à Pindorama, vamos às nossas especificidades.

É preciso lembrar que nos Estados Unidos “branco é branco , negro é negro e a mulata não é a tal”. Ao contrário da América do Norte, somos um país onde majoritariamente negros tiveram filhos com brancos, mais da metade da nossa população é …. mestiça.

Nossa sociedade foi se constituindo híbrida e, para alguns, essa característica foi imprimindo um caráter de vantagem identitária para a nossa cultura. Sendo assim, o vocábulo mulata ganhou novos sentidos, dentre os quais a ideia de uma exaltação à miscigenação, que atribuiu um significado positivo ao termo.

Será que devemos nos tornar reféns da etimologia? Não quero minimizar o preconceito praticado no Brasil, compreendo a carga que as palavras possuem, entretanto quero destacar que a natureza da discriminação praticada aqui exige uma reflexão que considere a nossas especificidades.

Na foto, Marina Montini no baile do Copacabana Palace em 1969. Foto publicada na revista Fatos e Fotos nº 421.

O índex das fantasias proibidas no carnaval

Na Roma Antiga os dias do carnaval eram para se festejar Baco, fazer sátiras, críticas ao governo e governantes. Diz a lenda que o deus Saturno pregava a igualdade entre os homens. Escravos e seus senhores invertiam os papéis.

A inversão de papéis sempre fez parte da festa : pobre vira rico, rico se fantasia de pobre. Esta talvez seja uma das grandes transgressões dos festejos de momo que sobreviveu através dos tempos, entretanto, como nada dura para sempre a Terra gira e literalmente a máscara caiu.

Estudiosos afirmam que a opção em fantasiar-se não é imune ao contexto em que vivemos. Ninguém sai de fadinha impunemente…Portanto, na hora de escolher o seu disfarce para o entrudo, pense bem, vivemos tempos complicados.

Fantasiar-se de nega maluca, por exemplo, pode reforçar estereótipos. Por que motivo uma pessoa colocaria uma peruca black power e pintaria a cara para parecer negra, a não ser por um interesse claro em reafirmar os mecanismos de dominação e exploração perpetrados pelo patriarcado-racista-capitalista? Nega maluca não pode.

Se você pensou em sair de índio, cantarolando “índio quer apito“ , sinta-se a encarnação do malévolo general Custer, desista. Lideranças nativas já denunciaram que suas comunidades se sentem desrespeitadas com o uso de seus trajes por foliões alienados. A marchinha óbvio , já foi para lata de lixo da história.

Se não pode índio , não deve poder cigano também, outra minoria perseguida e dizimada mundo afora.

Pirata , nem pensar , um grupo de marginalizados que roubavam os espanhóis, que por sua vez saqueavam as Américas! Como ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão, nada de debochar desses bandidos sociais dos mares!

Nem ladrão , nem polícia, não ouse se fantasiar de agente da repressão: camiseta ,calça preta, coturno e uma imitação de pistola airsoft no coldre, PM do BOPE sem chance! O folião ainda vai correr risco de virar estatística e levar uns tiros no meio do trajeto.

Homem fantasiado de mulher, jamais! Feministas afirmam que homens fantasiados de mulher reforçariam os clichês negativos do universo feminino. Ou pior: os rapazes poderiam utilizar-se da invertida indumentária como uma estratégia de aproximação com o sexo oposto, portanto, assédio um grande absurdo!

Casal de namorados que pensa em sair de Pedrita e Bambam, sem comentário deve procurar com urgência um apoio psicanalítico.

Parelha de amigos que se anima em encarnar o homem morcego e seu assistente, também enfrentará suas dificuldades. Para início de conversa quem vai ser o Batman ? Assumir a identidade da dupla dinâmica de Gotham City dá sempre confusão…além do desafio em encontrar um voluntário para o papel do Robin, o dueto acaba sempre levantando suspeita por onde passa, santa inocência !

Melhor pensar bem antes de escolher a sua fantasia para o próximo carnaval os tempos são outros e ,sem querer ser nostálgico, não dá para negar que nos carnavais de antigamente tudo parecia ser mais simples…

As Marchinhas Proibidonas

Na foto, no Iate Clube do Rio de Janeiro, em 1967, vemos João Roberto Kelly flagrado nos braços de uma bela mulata ,na noite do Havaí, provavelmente ao som de uma de suas animadas marchinhas. Marchinhas que, quarenta anos depois, estão sob o fogo cerrado das patrulhas dos chamados politicamente corretos.

Uma polêmica agitou o pré-carnaval de 2017,alguns blocos resolveram banir marchinhas tradicionais dos festejos de momo. Segue a transcrição de trechos de algumas das canções e seus polêmicos versos:

O teu cabelo não nega, mulata/Porque és mulata na cor/ Mas como a cor não pega, mulata/Mulata, eu quero o teu amor….

Olha a cabeleira do Zezé/Será que ele é…/ Será que ele é bossa nova/…Parece que é transviado/Mas isso eu não sei se ele é.

Maria Sapatão/Sapatão, Sapatão/De dia é Maria/De noite é João…

As letras, indubitavelmente racistas, homofóbicas, simbolicamente validariam preconceitos e deveriam ser eliminadas das listas de execução de blocos conscientes.

Com o objetivo de trazer alguns elementos para o debate, destaco que as marchinhas em questão fazem parte do cancioneiro do carnaval brasileiro , são retratos de sua época, do contexto em que foram produzidas. Podemos ouvi-las considerando essas variáveis e datando sua desfaçatez em menosprezar e propagandear afirmativas preconceituosas.

Sabemos que a luta por uma sociedade que respeite os direitos individuais está longe da vitória. Contudo, outras modalidades musicais produzidas no passado e atualmente, afirmam uma visão excludente, sem que manifestações de repúdio se percebam na intensidade do atual debate sobre as marchinhas.

Toda essa discussão me remete ao hino nacional: Ouviram do Ipiranga as margens plácidas/De um povo heroico o brado retumbante/E o sol da liberdade, em raios fúlgidos/Brilhou no céu da pátria nesse instante… O povo estava representado do grito da independência? O sol da liberdade brilhou em 1822? Os escravos foram libertos? E aí , não devemos cantar o hino? As canções nacionais estão sempre marcadas por uma visão histórica elitista e ufanista.

Assim como no hino nacional, ao ouvir as clássicas músicas do carnaval carioca devemos superar as suas idiossincrasias, preconceitos ou a sua visão histórica discutível.

A compreensão crítica e contextualizada nos liberta da condição de repúdio. É possível ouvir e cantar letras anacrônicas e não ser afetado por elas, mesmo sendo alvo do seu deboche.

Será reponsável não cantar letras com valores desatualizados, ou será que mergulhamos num revisionismo ridículo? Os novos tempos exigem novas posturas. Parece complexo e é! Complexo e necessário.

Haroldo Costa, o nosso Orfeu

Ator, produtor, escritor na verdade muito mais que qualquer atividade exercida por ele, a importância de Haroldo Costa está no seu compromisso com a cultura do nosso país. Desde a segunda metade do século passado, vem resgatando e construindo a identidade cultural brasileira.

Falar que protagonizou Orfeu da Conceição, foi Jesus no Auto da Compadecida, escreveu dezenas de livros sobre o carnaval carioca, viajou o mundo divulgando a cultura brasileira, atuou em novelas e filmes? Nada seria suficiente para dimensionar a sua importância.

Haroldo também é um folião desses que não deixam passar um carnaval. Tive dificuldade de escolher uma foto para essa postagem. São inúmeros os registros dele e de sua esposa Mary Marinho nas páginas da Manchete e Cruzeiro nos últimos cinquenta anos.

Na foto Silvio César, Haroldo Costa, Mary Marinho, no Baile do Hotel Nacional, em 1974 .

Saudações ao nosso grande Orfeu.

Eike Batista, o símbolo de uma Era

No início dos anos 2000, o empresário Eike Batista era mais conhecido como marido da modelo Luma de Oliveira – embora já fosse milionário. Na foto publicada, vemos o grande gestor, pela primeira vez no sambódromo em 2001, acompanhando de sua esplendorosa consorte.

Assistiu no sambódromo, palco da grande ópera popular, ao desfile de enredos que em nada superariam a sua inacreditável história de vida.

Em apenas uma década, ele subiria de status, mais precisamente em 2012, quando a revista Forbes o colocou como o sétimo homem mais rico do mundo, com uma fortuna estimada em US$ 30 bilhões.Como chegou tão rapidamente ao topo?

A Nova Matriz Econômica da presidente Dilma concedeu incentivos fiscais e transferiu para o BNDES o equivalente a dez por cento do PIB com o objetivo de subsidiar grandes empresas, por meio do Programa de Sustentação do Investimento (PSI).

O BNDES foi utilizado para transferir dinheiro público para as empresas escolhidas pelo governo. O Estado brasileiro concedia crédito barato para empresários escolhidos pelo governo. Eram os chamados “campeões nacionais” – empresas brasileiras que receberam generosos financiamentos para se tornarem companhias de atuação global.

Dentre os escolhidos, Eike, o campeão dos campeões, o exemplo de empresário nacional. O grupo empresarial EBX teria recebido R$ 10 bilhões do banco estatal para tocar seus projetos.

Em troca das benesses governamentais os empresários eleitos pagavam propina a agentes públicos, davam agrados a autoridades (como a cessão de jatinhos para viagens) ou faziam doações eleitorais a políticos em troca de facilidades nos contratos com o governo e estatais.

Eike vendia vento num país imaginário criado pelos governantes da época, o que pode ser comprovado com o fato que desencadeou a derrocada do império X: no mesmo ano em que apareceu na lista da Forbes, 2012, se descobriu que os poços de sua petroleira, especificamente o campo Tubarão Azul, na Bacia de Campos, produziam um quarto do inicialmente avaliado! Era o início do fim. As ações da petrolífera despencaram e mergulharam as demais empresas do grupo numa profunda crise de confiança.

Para piorar a fonte secou, seja em função das investigações da Lava Jato ou da crise de caixa do governo, as “campeãs” passaram a ter de andar com as próprias pernas.

No final de janeiro de 2017, a polícia Federal desencadeou à Operação Eficiência, vertente da lava-jato no Rio e identificou, entre muitas falcatruas, uma transferência de US$ 16,5 milhões, do megaempreendedor para Sérgio Cabral.

Cabral e Eike se conheceram nas eleições de 2006, quando Eike, doou 400000 reais ao PMDB fluminense.

Quantas isenções fiscais? Que benefícios e facilidades o ex-governador concedeu ao empresário em retribuição à sua “generosidade “? A venda do terreno para construção do Porto de Açu por um preço bem abaixo do valor real? A Expulsão, com o auxílio da milícia, dos moradores locais em três dias?

Cinco anos após ser indicado como um dos homens mais ricos do mundo Eike Batista passou a procurado pela polícia.

Preso no final Janeiro de 2017, conseguiu habeas corpus, em abril do mesmo ano. O ministro do Supremo, Gilmar Mendes, ponderou que as acusações são graves. Mas isso, segundo Mendes, não é motivo para justificar que Eike fique preso. Segundo o ministro não há prova concreta de que Eike teria tentado atrapalhar as investigações. Acrescentou que os crimes supostamente praticados por Eike estão ligados ao grupo político do ex-governador Sérgio Cabral, que já não está no poder, e, portanto, não haveria chance de continuidade dos delitos.

Gilmar, explicou, ainda, que o empresário é suspeito de ter cometido corrupção ativa. Ou seja, ele pagava propina no suposto esquema. Portanto, a liberação dele não seria uma ameaça para se recuperar o dinheiro desviado, já que as quantias não estariam mais sob o domínio do empresário.

O campeão dos campeões entrará para a história como um símbolo de uma era marcada pela fraude.
Um enredo glamoroso, mas com uma evolução trágica: a história do vendedor de ar , num cortejo onde se misturam , inadvertidamente, alas de corruptos e corruptores, ganhou zero em harmonia e saiu sob vaias tonitruantes na passarela do povo.