Um país sem alvará

O carro “Um rio que era Doce” foi um dos grandes momentos do desfile da Portela , em 2017. Totalmente em barro, um pescador em pranto, chorava a tragédia de Mariana, ocorrida em novembro de 2015. Mal poderíamos imaginar, que quatro anos depois, a lama jorraria, outra vez, sobre outra cidade mineira Brumadinho.

Ao invés da participação de varias pessoas no carro, a “alegoria viva”, dessa vez Paulo Barros, optou em colocar somente um ator, Alexandre Maguolo. Uma homenagem aos pescadores do Rio Doce, que ficou imerso em lama depois do rompimento da barragem.

O enredo da escola falava sobre a importância dos rios na vida humana, desde a formação das civilizações, o comercio e a urbanização. A necessidade de preservação estava explicitada de forma genial através do carro citado.

Um sucessão de tragédias/crimes estão aos poucos destruindo o que chamo de Brasil.

Que o grito do pescador recriado de forma genial, para o desfile campeão da azul e branco de Madureira, acorde o nosso povo!

Volta Belchior!

Boa parte do que aprendi, em minha adolescência, foi através das músicas que ouvi em uma pequena vitrola. Caetano, Chico, Gonzaguinha, Ivan Lins, Milton, Elis, Bethânia, foram fundamentais na minha formação. Cresci acreditando “que uma nova mudança em breve irá acontecer…E o que há algum tempo era novo, jovem, hoje é antigo e que precisamos todos rejuvenescer…

Um dos responsáveis por parte do que penso e sou, Belchior, de 70 anos, morreu na madrugada deste domingo (30/4) em Santa Cruz do Sul (RS).
Belchior apareceu no Festival Universitário da TV Tupi, em 1971, com a música “Hora do Almoço” que acabou ganhando o primeiro lugar do concurso.

O cantor e compositor consolidou sua carreira com três discos geniais, lançados de 1974 a 1977.

Há dez anos sumido da vida pública, foi um artista, que para alguns, optou em viver a liberdade que cantava. Músico de sucesso na década de 70, ficou recluso, se ausentando dos palcos. Abandonou tudo.

Há outros intelectuais, não muitos, que optaram pela misantropia: J.D. Salinger de “O apanhador no campo de centeio”, rompeu com o mundo e foi se esconder no interior dos Estados Unidos. O Poeta francês Rimbaud parou de escrever e passou o restante da vida viajando.

Na onda dos blocos temáticos, no carnaval deste ano, 2017,os fãs do cantor cearense criaram em Belo Horizonte o “Volta Belchior.”

De acordo com o idealizador do bloco, Kerison Lopes, o cordão tem por objetivo homenagear o “filósofo da música popular brasileira”. “Ele é um dos principais compositores que trata de questões sociais em suas letras. Não tem uma letra que não ensina algo, cada verso dele é carregado de poesia e de significado“, afirma.

Ao ser perguntado o que achava do sumiço do cantor, Pedro Martins, outro fundador da agremiação, respondeu: “Achamos espetacular. Numa época que todos estão super expostos, com redes sociais e selfies banais, um artista respeitado, como o Belchior, decide se isolar, fugir do mainstream e viver a vida dele é um exemplo. A vontade sincera nossa era ir junto com ele. Alguns até brincam que o bloco deveria chamar “me leva, Belchior”.

Entretanto, uma outra versão sobre o desaparecimento do bardo de Sobral circula: saídas disfarçadas em hotéis sem pagamentos de diárias, malas retidas, inadimplência no pagamento de pensões aos filhos, mais fugas, dívidas milionárias, roupas e materiais de trabalho abandonados às pressas passaram a ser a rotina do cantor e sua nova companheira no sul do Brasil.

Misantropia? Um pensador que quis romper com seu passado ou a louca escapada de um mau pagador? Em dias onde uma narrativa criada vale mais que a verdade propriamente dita, prefiro ficar com a memória do ídolo dos tempos da adolescência que se apresentava como um rapaz latino americano, sem dinheiro no bolso sem parentes importantes…e que se recusava a envelhecer, guardado por Deus, contando o vil metal..

Obrigado pelas belas canções. Valeu Belchior!

Os atabaques da Ilha

Um dos momentos mais sensacionais do desfile de 2017 foi o toque dos atabaques da União da Ilha. A bateria de mestre Ciça (Estandarte de Ouro) enlouqueceu as arquibancadas com uma paradinha em que os ritmistas se abaixavam e o samba era sustentado por um grupo de atabaques.

Com o enredo “Nzara Ndembu -Glória ao Senhor do Tempo”, do carnavalesco Severo Luzardo, a escola insulana trouxe uma mensagem poética sobre o passado, o presente e o futuro da humanidade. A cosmogonia Banto/Angola pela primeira vez desfilou na Sapucaí.

Os trabalhos foram abertos por uma sensacional comissão de frente, comandada por Carlinhos de Jesus, que ganhou o estandarte de Ouro, encenando o ritual Macurá Dilê. Em sequência, uma impactante ala, “Os povos Bantos”, apresentava a nação de Angola.

Um dos melhores sambas do ano deu chance ao puxador, Ito Melodia, a dar um show de carisma e competência, mais um Estandarte de Ouro .

Infelizmente, num desfile marcado por graves acidentes com carros alegóricos , a Ilha teve dificuldade para colocar um dos seus na avenida: “O Fogo de Uiangongo”. Um buraco se formou entre a ala anterior e a alegoria. Erro que prejudicou, sem dúvida, a agremiação, que terminou em oitavo lugar.

Mas a imagem que vai ficar na memória de todos, são os Ogãs, “Tocadores de Atabaque”, incendiando as arquibancadas com toque do reino de Samba Kalunga.

Sagrado nas religiões africanas, o atabaque é utilizado para enviar e receber mensagens espirituais. Aquele que toca o tambor é um orador e um comunicador de mensagens sagradas. E os deuses da África ecoaram : Êh êh no girê, êh no gire/ Macurá dilê no girá/ É o tempo de fé, união/ O tambor da ilha a ecoar

Parabéns Ilha pelo grandioso desfile de 2017.

O pastor que virou prefeito na cidade do pecado

Belém tem o Círio de Nazaré, Salvador a festa de Iemanjá , Juazeiro do norte a festa de padre Cícero e quem se candidatar a alcaide dessas municipalidades deve se preparar para ocupar a função de anfitrião dos eventos citados. Não importando a religiosidade do ocupante do cargo.

Causou surpresa, poucos meses, depois de eleito a recusa do prefeito em comandar a maior festa popular da cidade do Rio de Janeiro, o Carnaval. Seria pelo fato do prefeito ser um “homem de fé”? Por que motivo um prefeito pentecostal não pode comparecer ao desfile das escolas de samba no Sambódromo?

Simples, respondeu o edil : “Nós temos que respeitar as pessoas, ninguém deve ser obrigado a fazer nada”.

Inacreditável a resposta, pois é protocolar a uma função executiva comparecer a cerimônias e eventos, mesmo não gostando. Faz parte da liturgia do cargo.

Na campanha que elegeu Marcelo Crivella chefe do poder executivo municipal da cidade do Rio de Janeiro , o compromisso de se separar a profissão de fé do então candidato da sua almejada função foi reafirmado em inúmeras ocasiões. O Estado é laico.

Os quatro dias de folia atraem um milhão de pessoas para a cidade. Os hotéis, restaurantes e o comércio agradecem. O adolescente e inacreditável argumento “de que ninguém deve ser obrigado a fazer nada ” não é admissível.

Somos Kardecistas, católicos, evangélicos, pentecostais ,budistas, cristãos ortodoxos, muçulmanos , umbandistas, candomblecistas… Somos tudo isso e o prefeito é somente prefeito.

Não é demagogia ir receber as chaves do carnaval carioca, como também afirmou o gestor, é cumprir o que foi prometido na campanha. Separar o público do privado, o joio do trigo.

“O carnaval foi uma invenção do diabo que deus abençoou!” O prefeito não precisa se esconder. Não há pecado algum em comandar os festejos do momo carioca. Pecado é prometer uma coisa e fazer outra , pecado é mentir.