O Bafo da Onça não botou o bloco na rua em 2017

Quinhentos e trinta blocos pediram autorização para desfilar em 2017,curiosamente, número inferior a 2016.Entretanto, houve aumento de público. Só Bola Preta, Favorita e Sargento Pimenta levaram nada menos do que 5.982.700 foliões às ruas, entre os meses de fevereiro e março. O recorde anterior era de 5,4 milhões de pessoas.

Infelizmente, o Bafo da Onça, deixou de desfilar no centro do Rio após 60 anos.

Um dos mais bem sucedidos blocos de embalo(ou empolgação-estruturado seguindo o modelo de bloco simples, sem variações de fantasias, alegorias e enredos)do Rio de Janeiro, deixa de desfilar no momento de inequívoca retomada do carnaval de rua no Rio de Janeiro. Retomada essa que reconfigurou os cordões.

A linha evolutiva das manifestações de momo ao ar livre aponta para uma multiplicidade de propostas. Blocos de todos os tipos expressam os mais diferentes segmentos, minorias e gostos. Marcante, também, é o acesso democrático. Não há cordas ou cercadinhos, nenhum tratamento especial para os que compraram camisetas(ou abadás). Ninguém paga nada para pular, só a bebida que compra.

A latinha de cerveja embala os foliões. Cervejarias patrocinam os grandes blocos(Os ambulantes nos blocos só podem vender a marca patrocinadora), onde gigantescos carros de som animam a turba de trocistas embriagados.Pela primeira vez, Sebastiana e Zé Pereira, duas ligas de blocos cariocas, deram as mãos, . Negociaram juntas um contrato de patrocínio com uma marca de cerveja para custear as despesas.

Aos poucos, ao distanciar-se dos trios elétricos, o cortejo vai se transformando numa procissão de pinguços sem nenhuma trilha sonora ao fundo. Trilha que quase nunca é composta por sambas ou marchinhas, vale tudo, nos chamados blocos temáticos: funk, sertanejo, Beatles, música brega, axé, Sertanejo universitário, MPB, Raul Seixas, Chico Buarque, Michael Jackson, Roberto Carlos. Esse ano, inclusive, muitas das tradicionais marchinhas, foram expurgadas sob a alegação de perpetuarem graves preconceitos.

Pequenas agremiações, para evitar reunir os milhões de foliões dos mega blocos, anunciam, em cima da hora , nas redes sociais, o local e hora do seu desfile, quase sempre não autorizado pela prefeitura. Levam pequenas caixas de som, onde a música eletrônica faz delirar a tribo dos descolados .

Moderninhos organizam pequenos cortejos em torno de performances corporais, brincam com o culto ao corpo, vestidos com roupas de malhar. Outros estimulam os seus seguidores a trazerem luzes de leds em suas indumentárias. Há ainda os que capricham nos looks inspirados no Egito Antigo. Feministas, nerds cinéfilos, também têm vez na folia carioca . Entretanto, o Bafo da Onça perdeu o seu espaço.

Nos anos 60/70, o Bafo reunia em torno de 6 mil figurantes, número maior do que muitas Escolas de samba, hoje em dia. Segundo, Ricardo Cravo Albim,“O bloco sofreu um esvaziamento desde a urbanização do bairro do Catumbi, principalmente com a construção do Elevado Trinta e Um de Março e da abertura do túnel Santa Bárbara, que dividiram o bairro em dois, demolindo casarões centenários e removendo quadras inteiras de moradores de famílias tradicionais do bairro, que mantinham como referência cultural os diversos blocos de empolgação, dentre os quais o próprio Bafo da Onça.”

Fundado em dezembro de 1956 pelo folião Tião Carpinteiro, o bloco resiste graças à insistência de Serginho Maria, filho de Tião Carpinteiro, que toca o Bafo da Onça junto ao fiel escudeiro Roberto Capilé e outros poucos abnegados.

“A situação está difícil. Tivemos problemas junto à prefeitura e ficamos sem dinheiro, sem patrocínio. Tudo ficou regularizado na quinta-feira antes do Carnaval. A gente não tinha mais tempo de montar o Carnaval, ” lamentou, Serginho Maria, em depoimento publicado pelo jornal, O Dia. O custo de colocar o Bafo na rua é de pelo menos 20 mil reais. A prefeitura, espero, deve entrar com cerca de 15 mil. O restante a gente precisa arranjar com amigos e patrocinadores”, completa.

Indubitavelmente, a destruição da bairro do Catumbi, base geográfica do Bafo , representou o mais importante fator de esvaziamento da agremiação, que sem patrocínio dos grandes financiadores, não teve alternativa, enrolou bandeira em 2017.

O aporte financeiro da prefeitura será fundamental para trazer o bloco de volta. Há espaço para todos. A estética, a tradição musical e a proposta do bloco do Catumbi permanecem contemporâneas. Talvez os antenados percebam que não há nada mais hipster do que foliões envoltos em panos printados de onça. Salvem o Bafo !

Jesus e Oxalá juntos, não pode! O tripé da discórdia

Uma das imagens mais bonitas do desfile de 2017, o tripé Santo e Orixá, gerou desconforto na arquidiocese. A Estação Primeira de Mangueira, cujo o enredo deste ano era “Só com a ajuda do santo”, concordou em não apresentar, no desfile das campeãs, o polêmico tripé .

O carro abordava o sincretismo religioso, com o Senhor do Bonfim venerado sob a imagem do Nosso Senhor Jesus Cristo em ascensão e Oxalá , orixá associado a criação do mundo. O elemento cenográfico desfilou ao lado da ala “A lavagem do Bonfim”, premiada com o estandarte de ouro de melhor ala de 2017.

No mesmo cortejo, santos apresentavam a escola na comissão de frente, ex-votos cobriam alegorias, São Jorge apareceu numa encenação da batalha contra o dragão, uma porta bandeira representou Nossa Senhora de Aparecida , estandartes em louvor aos santos juninos, tudo sem provocar polêmica alguma.

Teria sido o fato da alegoria retratar o filho de Deus, junto a passistas seminuas o que provocou a interdição? É bom lembrar que no ano de 2016, quando a escola foi campeã, um dos carros era o “Altar de devoção católica”, com uma escultura do Menino Jesus, que não sofreu críticas.

É inequívoco que o carnaval é uma festa profana, e esse é um imbatível argumento para que qualquer religião vete o uso de seus símbolos litúrgicos, sagrados, em seus cortejos.

Curioso, entretanto, como a sociedade aceita nos espaços públicos e laicos de poder (assembleias, tribunais, câmaras, fóruns, escolas) crucifixos em suas paredes. Como deve se sentir um judeu, muçulmano, budistas ou ateu diante de uma invasão do religioso em um espaço secular?

A permeabilidade da sociedade brasileira permite. O sincretismo que deu origem à Umbanda, culto genuinamente nacional, uma jabuticaba brasileira, apoia.

Não faz sentido aceitar que baianas do candomblé lavem as escadarias do Senhor do Bomfim, em Salvador, e uma escola de samba no Rio de Janeiro não possa ter a liberdade de desfilar seu resiliente tripé.

A Arquidiocese, que já havia visitado previamente o barracão da escola, disse não ter visto a escultura. Afirmou, também , não ter feito qualquer proibição. O presidente da Mangueira encerra o assunto assegurando que “houve um entendimento com a Igreja”.

O catolicismo brasileiro sobreviveu majoritário por séculos respeitando a originalidade das suas práticas no Brasil. Será que mudou o Brasil? Ou mudou a Igreja?

O carnaval 2017, em São Paulo, já começou!

E o prefeito recém empossado, um dia depois da sua posse, dois de janeiro, se fantasiou de gari. Varreu um trecho da calçada da rua Nove de Julho.Sorriu para os fotógrafos enquanto deu duas varridas no chão, em um gesto que durou dez segundos. Foi seu primeiro ato como alcaide da maior cidade do país.

Resgatou imediatamente a memória do também prefeito da capital paulista, Jânio Quadros, que descia do carro, no trajeto entre a sua residência e a sede do governo, pegava a vassoura e varria as calçadas sujas.

O mesmo Jânio adotou o escovão como símbolo de sua campanha, bem sucedida, à presidência da Republica, em 1960, representando o desejo de se varrer a corrupção do país.

Jânio era um politico populista. Curiosamente o atual prefeito João Dória fez campanha afirmando que não era político,mas,sim, um gestor. Nas eleições municipais de 2016,“gestores” se candidataram e se elegeram em inúmeras cidades brasileiras .

Ainda em campanha, o candidato João Dória foi responsável por uma curiosa declaração: “Algum dia, quem sabe, todos os brasileiros vão poder usar polo Ralph Lauren”. Teria sido para demonstrar humildade ou remediar a elitista afirmação, o primeiro gesto tomado em sua gestão ?

No sábado subsequente, 7 de janeiro, voltou a vestir o uniforme da gari e varreu um trecho da calçada da avenida Paulista sentido Consolação entre rua Itapeva e o Masp. Mais uma etapa da operação Cidade Linda. Será que numa próxima fase vai se juntar à equipe de limpeza de bueiros? Ou vai continuar varrendo calçadas limpas? Vai passar o dia todo torrando debaixo do sol inclemente?

Quem sabe o prefeito paulista estende sua solidariedade aos motoristas de ônibus,aos pedreiros, aos vendedores de picolé na praia. Nunca se sabe, o que se sabe é que Dória prometeu se vestir de gari e varrer um ponto da cidade todas as semanas até o fim da sua gestão.

Roupas de marca ou sem marca, uniformes de gari, ou de qualquer outra função, podem passar algum tipo de informação sobre quem os veste. A fantasia, ao contrário da roupa tem uma conotação de falsidade, algo que não existe. A foto exibe um prefeito fantasiado de gari. Uma inversão tipicamente carnavalesca.

Há muito o que fazer para livrar a maior cidade brasileira da sujeira e com certeza não será com atitudes demagógicas e populistas que atingiremos esse objetivo.