Quem nunca sentiu o corpo arrepiar ao ver esse rio passar? Agora, o arrepio é geral. As águas do ribeirão portelense inundaram a avenida. A maior vencedora do carnaval carioca, com vinte e um títulos, chegou ao pódio sem deixar dúvidas da sua merecida vitória. Há quarenta e seis anos que a azul e branco de Oswaldo Cruz não vencia sozinha.
Com certeza, a presença de Paulo Barros foi decisiva para o sucesso da agremiação. O mais premiado carnavalesco da segunda década do século vinte e um sobreviveu à desconfiança inicial de que não conseguiria executar um trabalho numa instituição com a tradição da Portela. Entretanto, nos seus dois enredos até agora desenvolvidos não só respeitou, como exaltou o patrimônio da águia carioca.
O Hino portelense também merece destaque. Samir Trindade, Elson Ramires, Neizinho do Cavaco, Paulo Lopita 77, Beto Rocha, Girão e J.Sales desenvolveram, a partir do enredo, uma composição cheia de poesia e belas harmonias. Num ano em que os sambas passaram em ritmo acelerado, abrindo mão do sincopado que lhe dá identidade, “Navega a barqueada, aos pés da santa em louvação / Para mostrar que na Portela o samba é religião. ”
Com o samba-enredo abraçado pelo povo da altaneira e cantado a plenos pulmões, a escola totalizou o máximo de pontos nos quesitos harmonia e evolução. Também ganharam nota máxima o casal de mestre e sala e porta bandeira: Danielle Nascimento e Alex Marcelino.
Muito sentida pela comunidade, a morte violenta do seu presidente, Marcos Falcon, em setembro de 2016, transformou a águia em fênix que das cinzas alçou o voo para vitória.
Ficará pra sempre na memória a ala dos crocodilos da Jamaica e os peixes nadando contra a correte na piracema da comissão de frente.
As coirmãs não fizeram feio. O voo de Aladim da Mocidade no seu tapete pra lá de mágico incendiou a Sapucaí. As baianas com as saias constituídas por saquinhos de Cosme e Damião e o deslumbrante tripé do sincrético Cristo/Oxalá provaram a força da verde e rosa. O Perseu salgueirense abriu, esplendorosamente, alas para a Divina comédia do carnaval carioca. A presença do cacique Raoni e outras lideranças indígenas na contundente crítica ao agronegócio apresentada pela Imperatriz Leopoldinense.E, por fim, a União da Ilha com seu desfile tribal divulgando a cosmogonia Banto, foi arrepiante.
Outro destaque da Portela foi uma contundente alegoria denunciando a morte do Rio Doce, em Minas Gerais, que reafirmando o papel de crítica social e politica que o desfile das escolas de samba pode apresentar. Infelizmente carros de outras agremiações perderam a direção ou se desmancharam aos olhos de todos . Acidentes trágicos que resultaram em vítimas, algumas com gravidade. Como diz o samba : … “Cantam pastoras e lavadeiras pra esquecer a dor/Tristeza foi embora, a correnteza levou“….e que leve para os tribunais os responsáveis por esses tristes episódios .
Que a vitória e a garra da comunidade de Madureira e Oswaldo Cruz inspire a todos a não esmorecer e a acreditar que ao mergulhar nas águas de um rio, esse nos levará sempre a novas experiências e quem sabe a realização dos nossos objetivos. Após uma longa espera a Portela chegou lá , campeã de 2017.