Colombina entre o sonho e o beijo

O teu beijo é tão doce, Arlequim…
O teu sonho é tão manso, Pierrô…

Pudesse eu repartir-me
encontrar minha calma
dando a Arlequim meu corpo…
e a Pierrô, minha alma!

Quando tenho Arlequim,
quero Pierrô tristonho,
pois um dá-me prazer,
o outro dá-me o sonho!

Nessa duplicidade o amor todo se encerra:
Um me fala do céu…outro fala da terra!

Eu amo, porque amar é variar
e , em verdade, toda razão do amor
está na variedade…

Penso que morreria o desejo da gente
se Arlequim e Pierrô fossem um ser somente.

Porque a história do amor
só pode se escrever assim:
Um sonho de Pierrô
E um beijo de Arlequim!

Na foto, uma anônima colombina no baile do pierrô, em de 1959. Esse amor que se completa, a multiplicidade do desejo … tomara que a foliã retratada, tenha tido sorte com seu quebra-cabeça humano e tenha preenchido o enorme vazio do seu coração.

A poesia acima , As Máscaras, foi escrita por Menotti Del Picchia. Filho dos imigrantes italianos que com cinco anos de idade mudou-se para a cidade de Itapira, interior de São Paulo. Foi diretor de A Noite e A Cigarra, entre 1920 e 1940, além de diversos outros jornais e revistas. Com Oswald de Andrade, Mário de Andrade e outros jovens artistas e escritores paulistas, participou da Semana de Arte Moderna Foi um dos mais combativos militantes da estética modernista. Morreu em São Paulo, no dia 23 de agosto de 1988.

Eneida e o Baile do Pierrô

Em 1958, na casa noturna Au Bon Gourmet, em Copacabana,aconteceu a primeira edição do baile do Pierrô. Eneida, Waldemar Cavalcanti, José Condé, Darwin Brandão, Carlos Ribeiro, Léa Souza e Silva, Thiago de Mello resolveram que era preciso trazer, para os salões do Rio de Janeiro, uma evocação dos carnavais da belle époque, com aqueles toques poéticos que fizeram história.O pierrô foi importado da França e aqui conservou aquele ar triste: sua fantasia simples e a cara mascarada de branco, os olhos pintados e bastante amargura na alma.A sua melancolia se exterioriza quando encarna o apaixonado, o incompreendido, saudoso da colombina que foi embora, deixando saudades imensas.
Um baile organizado nos melhores moldes, um exemplo de ordem a ser imitado, muita bebida e bastante lança-perfume sem nenhuma arruaça para tirar o brilho da festa: assim foi o baile do pierrô. A lotação do restaurante é de cento e oitenta pessoas. Entretanto, duzentos e cinquenta pessoas festejaram até o dia amanhacer animadas por doses generosas do mais autêntico escocês e alimentadas por uma ceia bem servida e ao som de uma orquestra incansável. Enumerar todos os intelectuais e artistas que reviveram os pierrôs, as colombinas e os arlequins seria impossível.Mas vale lembrar que Eneida estava exuberante na sua festa…Texto adaptado (original Flávio Damm) e publicado na Revista O Cruzeiro.O último baile do Pierrô aconteceu na boate Sucata, em 1968.Na foto, a jornalista Eneida de Morais, autora do livro: História do carnaval carioca.